Apesar de sua presença cada vez mais comum na vida cotidiana, os contratos continuam sendo notoriamente inacessíveis para os comuns mortais. Um estudo publicado na revista científica Cognition tentou perceber o que se passa com os textos dos documentos legais, sejam eles contratos, termos e condições…
Porque é que os textos são tão difíceis de perceber?
Neste estudo, uma análise de corpus (n ≈ 10 milhões de palavras) revelou que os contratos contêm proporções surpreendentemente altas de certos recursos difíceis de processar.
A análise de corpus é uma área importante que estuda e processa grandes coleções de textos para extrair informações valiosas e padrões linguísticos. Por meio de técnicas estatísticas e de inteligência artificial, é possível identificar tendências, padrões gramaticais e aspectos culturais nos textos analisados. Os resultados obtidos são aplicáveis em áreas como tradução automática, processamento de linguagem natural e análise de sentimentos. A análise de corpus também contribui para entender a evolução da linguagem, a variação linguística e a aquisição de línguas nativas.
Esses recursos difíceis de processar em relação a 9 outros géneros de referência do inglês escrito e falado, incluindo:
- jargões de baixa frequência;
- cláusulas de inserção central (que levam a dependências sintáticas de longa distância);
- estruturas em voz passiva;
- capitalização não padrão.
Jargões de baixa frequência referem-se a termos ou expressões que são menos comuns ou menos amplamente utilizados em determinado contexto. Essas palavras ou frases, muitas vezes, são específicas de um determinado grupo, comunidade ou área de conhecimento, e podem ser difíceis de compreender para aqueles que não estão familiarizados com elas.
A utilização de jargões de baixa frequência pode transmitir uma sensação de expertise ou pertencimento a um determinado grupo. No entanto, é importante ter cuidado ao utilizá-los, especialmente em situações em que a mensagem precisa ser compreendida por um público mais amplo.
Detalhes do estudo
Dois estudos (n = 184) revelaram ainda que trechos contendo esses recursos foram lembrados e compreendidos em taxas mais baixas do que trechos sem esses recursos, mesmo para leitores experientes, e que cláusulas de inserção central inibiram a lembrança mais do que outros recursos.
As conclusões do estudo contribuem para
- Minar a teoria de conceitos especializados do direito, segundo a qual a lei seria um sistema construído sobre o conhecimento especializado de conceitos técnicos;
- Sugerir que essas dificuldades de processamento resultam principalmente das limitações da memória de trabalho impostas por dependências sintáticas de longa distância (ou seja, má redação), em vez de uma mera falta de conhecimento jurídico especializado;
- Sugerir que a edição de recursos problemáticos de textos legais seria viável e benéfica para a sociedade em geral.
Fonte: Martínez, E., Mollica, F., & Gibson, E. (2022). Poor writing, not specialized concepts, drives processing difficulty in legal language. Em Cognition (Vol. 224, p. 105070). Elsevier BV. https://doi.org/10.1016/j.cognition.2022.105070