A cistinúria é uma doença assim designada porque pressupões a excreção urinária de cistina e aminoácidos dibásicos. Trata-se de uma doença genética autossómica recessiva, causada por mutações do gene GBA – gene da glucocerebrosidade – que codifica a enzima com o mesmo nome, sendo que a presença de mutações genéticas determinam a deficiência nessa atividade. Desta forma, os pais das crianças afetadas são avaliados como tendo aumentos normais, moderados ou significativos na excreção de cistina na urina. Mais concretamente, o que se verifica nesta patologia é um acúmulo intralisossomal de glucocerebrosídeo nos tecidos do sistema reticuloendotelial, sendo estas células designadas por células de Gaucher o que confere o mesmo nome à doença. Ocorre com maior prevalência em comunidade judaicas e 1 em cada 40000 a 60000 na população em geral.
Por tudo o que está associada, é considerada uma doença multissistémica, associada com grande variação nas suas manifestações clínicas, na sua gravidade e evolução. A maioria das manifestações clínicas caracteriza-se por quadros anémicos, hepatoesplenomegalia e lesões ósseas, acometimento pulmonar e envolvimento do sistema nervoso central (SNC).
É classificada em três tipos, de acordo com a presença ou ausência de doença primária no SNC:
- Tipo 1: é não neuropática, sendo esta a forma mais comum, responsável por 99% dos casos;
- Tipo 2: conhecida como tipo infantil com comprometimento grave do SNC na infância;
- Tipo 3: com comprometimento leve do SNC, na adolescência ou no adulto jovem.
O defeito primário resulta em menor reabsorção no túbulo renal proximal de cistina e maior concentração de cistina na urina. Como a cistina é pouco solúvel na urina ácida, de modo que, quando sua concentração urinária excede a sua solubilidade, os cristais precipitam cistina, o que forma cálculos renais. A reabsorção de outros aminoácidos dibásicos (lisina, ornitina, arginina) também está diminuída, mas não acarreta problemas, pois estes aminoácidos têm um sistema de transporte alternativo separado daquele da cistina. Além disso, na urina eles são mais solúveis do que a cistina e o aumento de sua excreção não forma cristais ou cálculos. Consequentemente, a absorção desses aminoácidos no intestino delgado também está diminuída.
Sintomatologia
Os sintomas da cistinuria já vieram vindo a ser descritos no tópico anterior, mas mais comumente envolve cólica renal resultado da formação de cálculos, podendo aparecer nas crianças, mas geralmente surgem entre os 10 e 30 anos de idade. Pode se desenvolver infeção do trato urinário decorrente de obstrução do trato urinário.
Diagnóstico
- Exame microscópico do sedimento urinário;
- Medida da excreção urinária da cistina;
- Análise dos cálculos renais.
Os cálculos radiopacos de cistina formam-se na pelve renal ou na bexiga. Cálculos coraliformes também são muito comuns. Na urina, a cistina pode aparecer sob a forma de cristais hexagonais castanho-amarelados.
Pode também ser realizado um teste com cianeto-nitroprussiato para revelar a presença de cistina na urina. A excreção quantitativa de cistina é tipicamente > 400 mg/dia na cistinúria (o nível normal é < 30 mg/dia).
Tratamento
- Grande ingestão de líquidos;
- Alcalinização da urina com bicarbonato de potássio;
- Restrição de sódio alimentar;
- Restrição de proteínas na dieta (quando possível).
Doença renal em estágio terminal pode ocorrer. A redução da excreção de cistina na urina diminui a toxidade renal e é alcançada por aumento do volume urinário com ingestão de líquidos suficiente para fornecer uma taxa de fluxo urinário de 3 a 4 l/dia. A hidratação é particularmente importante à noite, quando cai o pH. A alcalinização da urina para pH > 7 é feita com citrato ou bicarbonato de potássio e, em alguns casos, acetazolamida que aumenta, significativamente, a solubilidade da cistina.
Cerca de metade de todos os pacientes desenvolve alguma manifestação tóxica, como febre, erupção, artralgias ou, mais raramente, síndrome nefrótica, pancitopenia ou reação lúpus-símile. É muito importante monitoramento cuidadoso da resposta terapêutica.
Fontes: Manual MSD Versão Para Profissionais de Saúde – Cistinúria, por Christopher J. LaRosa, MD, Perelman School of Medicine at The University of Pennsylvania. Artigo: Jornal de Pediatria, vol.78 no.6 Porto Alegre Nov./Dec. 2002 – Aspectos clínicos e nutricionais da doença de Gaucher: estudo prospectivo de 13 crianças em um único centro, por Maria Christina L.A. Oliveira, Benigna M. Oliveira, Elisa Queirós, Marcos B. Viana. DOI: https://doi.org/10.1590/S0021-75572002000600013.